23 de jun. de 2011

O Conto do Desconto


Havia uma estranha cidade, num estranho país onde habitavam estranhas pessoas. Essas pessoas não tinham nem nome, nem apelido, nem alcunhas, nem raça, nem outro tipo de identificação a não ser, um preço;


Essas pessoas eram todas tabeladas, colocadas por ordem de valor (do mais caro ao mais barato) e inseridas num grande computador que só percebia de números e nada mais.


Eis que um dia, o preço 240,50€ entra numa biblioteca. Essa biblioteca estava carregada de livros que nunca foram abertos, então esse preço perguntou-se de que servia uma biblioteca se não se podia ler os livros.


Surge de um canto escuro da biblioteca um preço que pelo que se podia ver outrora tivera sido de grande valor, mas hoje só custava 14,00€, aproxima-se do preço mais caro, diz-lhe ao ouvido: «olha, que fazes aqui? Não sabes que preços como tu só vão visitar lojas de livro, porque aqui nas bibliotecas não há nada mais do que livros velhos e fechados?» diz o preço baixo com ar de rejeição.


O preço 240,50€ ficou assim como que indignado, quer dizer, ao que parecia já nem sequer era bem-vindo numa biblioteca; já não bastava que todos os dias os preços mais baixos (que existiam em maior quantidade…) o olhassem mal, mas também agora era quase que enxotado dos lugares a onde ia.


Como já referi, esta cidade era estranha: o suposto era que sendo um preço tão caro fosse respeitado, fosse bem-vindo e fosse distinguido de todos os outros, mas neste país, como os números são infinitos, havia sempre algum que se sobrepunha ao outro: e portanto o 240,50€ não era mais do que um preço baixo, porque para além dele existia o 250, o 300, o 400… o infinito.


Então um dia, farto de ser sempre menosprezado, tanto como pelos preços mais baixos que ele como pelos mais altos, o nosso 240,50€ foi a um banco. Nesse banco pediu com alguma timidez para que lhe fizessem um desconto: «um desconto? Mas o senhor está maluco ou quê? Sabe que se lhe passo um desconto ficará inferior a todos os preços baixo?». Ao que o 240,50€ respondeu: «por mim, eu ficava a ser 0,00€. De que serve ser um preço alto quando na verdade vivo uma ilusão? Eu prefiro ser como toda a gente, e não como mais um. Um zero, mas diferente.»


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