13 de dez. de 2010

podemos perder quem amámos

«Minha querida Mãe,
               Hoje fui ao grupo de apoio, e a Mary sugeriu que eu te continuasse a escrever, muito embora não me possas ler. Ela disse que isso me faria sentir mais próxima de ti, e que podia ainda haver coisas que gostaria de te dizer.
               Vim a nossa casa para te escrever, e estou sentada à mesa da cozinha. A casa irá ser vendida em breve, mas neste momento posso imaginar que estás deitada no teu quarto, ou que estás a trabalhar e que espero por ti para que me possas falar dos bebés que ajudaste a nascer, ou para que simplesmente me dês um abraço. A pior parte ao regressar a casa foi que procurei de imediato um recado teu na porta do frigorífico, e não havia nenhum. A porta estava branca e vazia. Chorei durante horas.
               Tenho saudades tuas, Mãe. Gostava tanto que ainda estivesses entre nós. Gosto de viver com o Pai, mas queria que ainda estivesses cá. Não compreendo porque tiveste de ser afastada de mim, nem porque adoeceste, nem como morreste tão rapidamente quanto outras mulheres sobrevivem a esta doença a toda a hora. Como é possível que isto tenha acontecido? Como pudeste simplesmente partir? Como me pudeste deixar? É como se estivesse zangada contigo, Mãe. Já viste que parvoíce?
               Lembras-te de quão bonito estava o Outono, como olhávamos pela janela do teu quarto quando pioraste e contemplávamos o céu a pintar-se de amarelos e vermelhos? Tentaste lutar contra isto com tanta força, Mãe. Custa-me tanto que tenha sido tão difícil para ti.
               O Inverno foi longo e frio. Tenho ido à escola, mas a maior parte do tempo sinto-me como se no meio de nevoeiro. A Emma tem sido muito querida, assim como o James, e a Gina tem sido extraordinária, Mãe, nem ias acreditar. Mas eles não são a minha mãe. O Natal foi horrível.
               A Mary tem razão. Sinto-me mesmo melhor por te estar a escrever, apesar de me fazer chorar mais do que chorei nos últimos meses. Ela diz que é natural sentirmo-nos tristes, zangados e confusos. Mas não me parece natural. De maneira nenhuma.
               Suponho que deva acrescentar que o Peter está óptimo. Montei a gaiola dele em casa do Pai, e quando me sento ao pé dele e lhe faço festas recordo-me do Verão e Outono que passámos juntas, a fazer aqueles álbuns de fotografias, a jantar aquelas comidas que a Gina cozinhava, a conhecermo-nos melhor uma à outra. Posso forçar-me a esquecer quão difícil foi para ti o fim, mas nunca me esquecerei do quão forte foste, quão corajosa. Tenho uma fotografia de ti sentada na cadeira de rodas no hospital. Os teus olhos estão tão grandes e bonitos. Pareces surpreendida, Mãe, como se tivesses sido apanhada desprevenida. Sinto que ambas fomos.
               Quem em dera que tivéssemos tido mais tempo, Mãe. Acho que é sobretudo isto que te queria dizer. Quem me dera ter tido mais tempo contigo. Contudo, estou grata pelo tempo que passámos juntas. Muito grata. Quando voltar para casa do Pai, vou olhar para os álbuns e recordar-me de tudo.
               Acho que vou deixar aqui esta carta para ti. Nesta cozinha vazia. Para que saibas, se voltares a casa, que te amo e que sinto muito a tua falta. Por favor, não te preocupes comigo.
               A tua filha,
               Claire»

É este o excerto que nos tocou, que nos fez chorar. Eu própria já li esta carta muitas vezes e em toda elas me emocionei. Que todos aprendamos a valorizar quem nos rodeia, os pais, os avós, os tios. Não devemos ter vergonha de ser vistos na rua com eles, foram eles que criaram condições para sermos quem somos hoje.  Em vez de vergonha, tenhamos orgulho em ter quem nos ama por perto, nunca sabemos quando eles podem partir!

3 comentários:

Anônimo disse...

Obrigado por nos lembrares esses valores. Enão te esqueças que não estás a escrever para a parede, há gente que te ouve!!

silviafreitas. disse...

Era do livro da Sónia, certo?
Aquele excerto que emocionou muita gente na aula de Lingua Portuguesa...

Mariana disse...

sim sílvia , achei que era melhor partilhar ( :